FERROPTOSE — O que é, para que serve e como acontece?

Uma nova fronteira na biologia da morte celular programada

A ferroptose é um tipo altamente específico de morte celular regulada que ocorre dependendo da presença de ferro intracelular e do acúmulo de danos oxidativos em lipídios da membrana plasmática. Trata-se de um processo bioquímico distinto da apoptose, necrose, necroptose e autofagia, tanto morfologicamente quanto mecanisticamente.

 

A ferroptose foi descoberta e descrita pela primeira vez em 2012 pelo pesquisador Brent R. Stockwell e sua equipe da Universidade Columbia (EUA).

O estudo seminal foi publicado na revista Cell com o seguinte título:

“Ferroptosis: An Iron-Dependent Form of Nonapoptotic Cell Death”

Dixon SJ, Lemberg KM, Lamprecht MR, et al.
Ferroptosis: An Iron-Dependent Form of Nonapoptotic Cell Death.
Cell. 2012;149(5):1060–1072.
🔗 https://doi.org/10.1016/j.cell.2012.03.042

 

Resumo do marco:

  • Autor principal: Scott J. Dixon (primeiro autor), sob orientação de Brent R. Stockwell

  • Instituição: Columbia University

  • Contribuição: Identificaram uma forma de morte celular induzida por pequenas moléculas (como erastina) que dependia de ferro e peroxidação lipídica, mas era independente de caspases ou apoptose

  • Nome cunhado: Ferroptosis (ferrum + apoptosis-like)

 

Para que serve a ferroptose?

A ferroptose não é um “erro”, mas uma ferramenta fisiológica e evolutivamente preservada. Ela tem importantes funções na:

  1. Defesa contra células danificadas ou tumorigênicas — ajuda a eliminar células com alterações graves no metabolismo do ferro e do redox.
  2. Resposta inflamatória controlada — embora não cause liberação maciça de conteúdo intracelular como na necrose, ela pode estimular imunidade inata.
  3. Desenvolvimento embrionário e modelagem tecidual — evidências crescentes mostram seu papel no remodelamento celular seletivo.
  4. Controle de populações celulares em ambientes de estresse oxidativo — onde outras vias de morte celular seriam menos eficientes ou já falharam.

Contudo, a ferroptose pode se tornar patológica quando ocorre em excesso ou em tecidos não-alvo, como no sistema nervoso central, fígado, coração e rins, sendo associada a doenças degenerativas e inflamatórias.

Quando a Ferroptose Ajuda, e Quando Prejudica?

A ferroptose tem uma natureza dual: é tanto protetora quanto destrutiva, dependendo do contexto biológico, tissular e redox em que ocorre.

Quando é Protetora:

  • Antitumoral: elimina células com mutações oncogênicas e excesso de ferro
  • Anti-inflamatória: remove células danificadas sem liberar DAMPs
  • Remodelamento tecidual: atua em desenvolvimento embrionário e neuroplasticidade
  • Controle oxidativo: protege tecidos de propagação de estresse oxidativo crônico

Quando é Patológica:

  • Excesso de ferro: NTBI circulante ativa ferroptose não seletiva (ex: hemocromatose)
  • Tecido não regenerativo: SNC e miocárdio são altamente vulneráveis
  • Ativação crônica: morte celular acumulativa sem resolução tecidual
  • Falha dos sistemas antioxidantes: GSH e GPX4 depletados levam a dano celular autossustentado

Fatores Determinantes do Limiar:

Fator

Quando é Protetora

Quando é Destrutiva

Nível de ferro intracelular

Controlado e tamponado

Elevado, com NTBI

Sistema antioxidante

GSH/GPX4 ativos

Depletado ou inibido

Tipo celular

Células substituíveis

Células pós-mitóticas (neurônios, miócitos)

Duração

Transitória

Prolongada e crônica

Sinalização adjacente

Integrada com autofagia/apoptose

Autônoma e amplificada

A ferroptose é benéfica quando atua como mecanismo seletivo de eliminação e remodelamento.

É destrutiva quando é descontrolada, ocorre em órgãos críticos ou é induzida por sobrecarga crônica de ferro.

O que é a ferroptose, em termos simples e precisos?

É um tipo de morte celular induzida pelo acúmulo descontrolado de espécies reativas de oxigênio (ROS) que oxidam lipídios de membrana — especialmente os ácidos graxos poli-insaturados (PUFAs). Esse processo só ocorre na presença de ferro. Por isso o nome: “ferro” + “ptose” (queda ou morte, em grego).

Ela ocorre quando os sistemas de defesa antioxidante falham — em especial, quando há:

  • Depleção de glutationa (GSH), o principal antioxidante celular,
  • Inibição da enzima GPX4, que neutraliza lipídios oxidados,
  • E um excesso de ferro livre, que catalisa a geração de radicais livres pela Reação de Fenton.

 

Como acontece a ferroptose, passo a passo?

  1. Acúmulo de ferro intracelular:
    O ferro entra na célula via receptor de transferrina e pode se acumular como ferro ferroso (Fe²⁺), altamente reativo.
  2. Geração de radicais livres (ROS):
    O ferro catalisa a Reação de Fenton, transformando peróxido de hidrogênio (H₂O₂) em radical hidroxila (•OH) — a forma mais agressiva de radical livre.
  3. Oxidação de lipídios de membrana:
    Os radicais livres atacam preferencialmente ácidos graxos poli-insaturados (PUFAs) nas membranas celulares, formando hidroperóxidos lipídicos tóxicos.
  4. Falência do sistema antioxidante:
    • A glutationa peroxidase 4 (GPX4) normalmente reduz esses peróxidos, usando glutationa (GSH).
    • Se faltar GSH (por inibição da captação de cistina) ou se a GPX4 for inibida diretamente (por fármacos como RSL3), os peróxidos se acumulam.
  5. Morte celular por colapso lipídico:
    O dano às membranas causa ruptura progressiva da integridade celular, condensação mitocondrial, e a célula entra em colapso funcional, sem ativar vias apoptóticas clássicas.

 

O que diferencia a ferroptose de outras formas de morte celular?

Aspecto

Ferroptose

Apoptose

Necrose/Necroptose

Dependência de ferro

Sim

Não

Não

Principal mecanismo

Peroxidação lipídica

Caspases + Fragmentação nuclear

Perda da integridade celular

Morfologia

Mitocôndrias condensadas

Núcleo picnótico e apoptotic bodies

Edema celular e lise

Reversibilidade

Parcialmente reversível no início

Geralmente irreversível

Irreversível

Papel inflamatório

Moderado (dependente do contexto)

Imunologicamente silenciosa

Fortemente inflamatória

 

Por que a ferroptose está ganhando tanta atenção?

Porque ela abre novas janelas terapêuticas para doenças em que a morte celular oxidativa é o gatilho principal:

  • Câncer: certos tumores, especialmente com mutações RAS, são muito sensíveis à ferroptose — o que torna possível atacá-los com indutores específicos.
  • Doenças neurodegenerativas: Alzheimer, Parkinson e esclerose lateral amiotrófica apresentam acúmulo de ferro e danos lipídicos — alvos clássicos da ferroptose.
  • Isquemia-reperfusão (coração, cérebro, rins): o estresse oxidativo gerado durante a reperfusão parece ativar vias de ferroptose.
  • Hepatopatias e hemocromatose: o fígado, como órgão de acúmulo de ferro, é extremamente vulnerável à peroxidação lipídica — e a ferroptose pode explicar parte das lesões inflamatórias e fibrogênicas.
  •  

Resumo conceitual

A ferroptose é o elo perdido entre o metabolismo do ferro, o estresse oxidativo e a integridade das membranas celulares. É como se o ferro, fundamental à vida, tornasse-se agente da morte celular quando seus mecanismos de controle falham.

FERROPTOSE E HEMOCROMATOSE 

Relações Fundamentais e Clínicas

1. Introdução: O elo entre ferro em excesso e morte celular oxidativa

A hemocromatose é uma condição caracterizada pelo acúmulo progressivo de ferro no organismo, principalmente no fígado, pâncreas, coração, hipófise e articulações. Já a ferroptose é uma forma de morte celular regulada induzida por sobrecarga de ferro e peroxidação lipídica. Portanto, os dois processos compartilham um núcleo fisiopatológico comum: o ferro em excesso como agente de dano tecidual.

Na prática, a hemocromatose favorece a indução da ferroptose em diversos tecidos-alvo, principalmente quando há falência dos mecanismos antioxidantes locais. Isso explica parte do dano inflamatório, fibrogênico e degenerativo observado nos órgãos comprometidos.

2. Mecanismos pelos quais a Hemocromatose ativa ou facilita a ferroptose

Fator Patológico

Hemocromatose

Consequência na Ferroptose

Excesso de Ferro Livre (Fe²⁺)

Saturação da transferrina, aumento de NTBI (non-transferrin-bound iron)

Substrato para a Reação de Fenton, com produção de radicais hidroxila

Depósito hepático de ferro

Atinge hepatócitos e células de Kupffer

Favorece peroxidação lipídica e disfunção mitocondrial

Estresse oxidativo crônico

Aumenta com o avanço da sobrecarga de ferro

Compromete os sistemas de defesa (GSH/GPX4), facilitando a ferroptose

Disfunção do metabolismo antioxidante

Depleção de glutationa hepática, redução da atividade de catalases e peroxidases

Impede neutralização de peróxidos lipídicos

Lesão mitocondrial induzida por ferro

Ferro mitocondrial interfere na respiração celular e acúmulo de ROS

Ativa o ciclo de oxidação lipídica autoalimentado

Repetidas agressões inflamatórias

Ativação de NF-κB, IL-6 e TNF-α nas fases avançadas

Potencializa dano celular e sensibiliza tecidos à ferroptose

Lipoperoxidação hepática progressiva

Marcador precoce e contínuo na hemocromatose

Eixo central da cascata ferroptótica

3. Órgãos mais vulneráveis à ferroptose na Hemocromatose

Fígado

  • Principal sítio de depósito de ferro.
  • A ferroptose contribui para hepatite oxidativa silenciosa, fibrogênese, esteato-hepatite e transição para carcinoma hepatocelular.
  • Estudos mostram que a ferroptose precede a necrose nos lobos hepáticos mais afetados.

Coração

  • Depósito de ferro nos miócitos leva a lesões mitocondriais progressivas.
  • Ferroptose contribui para miocardiopatia restritiva, disfunção diastólica, arritmias e fibrose miocárdica.
  • Inibição farmacológica da ferroptose em modelos murinos reduziu a insuficiência cardíaca.

Sistema Nervoso Central

  • Embora mais protegido, a hemocromatose pode levar a microdepósitos de ferro em núcleos da base e no córtex.
  • A ferroptose está implicada na gênese de déficits cognitivos, fadiga mental crônica e risco neurodegenerativo em pacientes com HH.

Articulações e tecidos sinoviais

  • A peroxidação lipídica local induzida pelo ferro pode estar implicada na gênese da artropatia ferropriva.
  • Sinais precoces de degeneração sinovial incluem alterações mitocondriais compatíveis com ferroptose.

Pâncreas e células β

  • Ferroptose em células β pancreáticas pode contribuir para diabetes secundário à hemocromatose, agravando a resistência insulínica.

4. Evidências Científicas Recentes

  • Um estudo de Wang et al. (2020, Cell Metabolism) demonstrou que ratos com superexpressão de ferro apresentaram marcadores clássicos de ferroptose no fígado, antes mesmo da elevação de transaminases.
  • Em modelos in vitro, a exposição de hepatócitos humanos a NTBI resultou em morte ferroptótica, revertida por ferrostatina-1, um inibidor específico da ferroptose.
  • Outros estudos mostram que a inibição da ferroptose pode retardar a progressão da fibrose hepática em hemocromatose experimental.

5. Aplicações clínicas potenciais: diagnóstico e tratamento

Aplicação

Justificativa

Biomarcadores de ferroptose

Avaliar expressão de GPX4, ACSL4, SLC7A11↓ e MDA (malondialdeído) em tecidos hepáticos e cardíacos

Inibidores da ferroptose

Uso de ferrostatina-1, liproxstatina-1, CoQ10, N-acetilcisteína ou deferoxamina como terapia adjunta

Prevenção de complicações

Pode reduzir progressão para cirrose, câncer hepático e disfunção cardíaca precoce

Rastreamento precoce

Testes moleculares de susceptibilidade à ferroptose (ex: polimorfismos em GPX4, SLC7A11)

6. Conclusão

A ferroptose é uma peça-chave na fisiopatologia da hemocromatose, explicando muitos dos danos orgânicos que antes eram atribuídos apenas ao “acúmulo de ferro”. Ela representa uma ponte mecanística entre o excesso de ferro e as consequências celulares letais, sendo ao mesmo tempo um marcador de lesão tecidual e um alvo terapêutico emergente.

Ao compreender a ferroptose dentro do contexto da hemocromatose, médicos, pesquisadores e pacientes ganham uma nova perspectiva para diagnóstico precoce, prognóstico e intervenção terapêutica personalizada.

Ferroptose como eixo central das lesões irreversíveis na Hemocromatose Avançada

A ferroptose pode ser compreendida como o “executor final” da toxicidade do ferro quando o acúmulo se torna crônico e ultrapassa os limites da capacidade antioxidante do organismo. O excesso de ferro, por si só, não é tóxico enquanto está sequestrado (ferritina, transferrina, hemosiderina). O problema começa quando ele circula livre (NTBI – ferro não ligado à transferrina) ou se deposita nos tecidos em formas redox ativas, o que catalisa a peroxidação de lipídios e a morte celular silenciosa e progressiva por ferroptose.

Essa via torna-se patológica e devastadora quando atinge os seguintes sistemas:

1. Fígado: da inflamação silenciosa ao carcinoma hepatocelular

O fígado é o principal órgão de armazenamento e detoxificação do ferro, e portanto, o epicentro da ferroptose na hemocromatose.

a) Hepatite oxidativa crônica silenciosa

  • A deposição de ferro no lobo hepático 1 e 4 induz morte ferroptótica dos hepatócitos.
  • Inicialmente, essa lesão é subclínica, mas progressiva.
  • A destruição celular contínua ativa células estelares hepáticas, promovendo fibrose reacional.

b) Fibrose → Cirrose → Carcinoma Hepatocelular

  • O dano crônico e a regeneração desorganizada favorecem a mutagênese oxidativa.
  • A ferroptose desregulada cria um microambiente carcinogênico.
  • O carcinoma hepatocelular na hemocromatose ocorre mesmo na ausência de hepatite viral ou alcoólica, sendo considerado ferro-induzido.

c) Hepatite fulminante

  • Em raros casos, surtos de peroxidação lipídica massiva levam a falência hepática aguda com necrose hemorrágica.
  • Essa situação simula hepatites fulminantes virais, mas tem substrato oxidativo.
  • O achado de mitocôndrias colapsadas, morte celular sem inflamação proeminente e intensa oxidação lipídica é patognomônico de ferroptose.

2. Coração: da disfunção diastólica à morte súbita

O coração, embora não seja o principal local de depósito inicial, torna-se gravemente afetado na hemocromatose avançada, especialmente com idade mais avançada e em homens.

a) Lesão mitocondrial miocárdica

  • A ferroptose altera o metabolismo energético do miócito, iniciando pela disfunção mitocondrial progressiva.
  • Isso leva à miocardiopatia restritiva, com insuficiência cardíaca de padrão diastólico.

b) Arritmias e morte súbita

  • A morte seletiva de miócitos, especialmente nas regiões condutoras, favorece reentrada elétrica e taquiarritmias malignas.
  • A ferroptose sem necrose visível é causa subestimada de morte súbita em pacientes com hemocromatose ainda “compensada” do ponto de vista clínico.

c) Falência de contratilidade

  • Com a progressão, ocorre perda difusa de fibras e fibrose intersticial secundária à ferroptose crônica, levando a cardiopatia terminal.

3. Cérebro: dano funcional, cognitivo e emocional persistente

Embora o sistema nervoso central seja protegido pela barreira hematoencefálica, na hemocromatose avançada ocorre:

a) Deposição de ferro em núcleos da base, cerebelo e córtex

  • Regiões como substância negra, globo pálido e hipocampo acumulam ferro com a idade, o que é amplificado na HH.

b) Comprometimento neuropsiquiátrico

  • A ferroptose crônica nessas regiões leva a:
    • Lentificação mental
    • Fadiga refratária
    • Depressão oxidativa
    • Comprometimento executivo
    • Risco aumentado de doenças neurodegenerativas (ex: Doença de Alzheimer precoce)

c) Alterações detectáveis por neuroimagem funcional e PET scan

  • Redução de captação metabólica em áreas afetadas
  • Sinais de peroxidação lipídica cerebral por marcadores indiretos

4. Pâncreas: falência total do metabolismo glicêmico

O pâncreas, especialmente as células β das ilhotas de Langerhans, é extremamente vulnerável ao ferro livre.

a) Ferroptose seletiva das células β

  • As células β são altamente sensíveis ao estresse oxidativo e não têm mecanismos eficientes de tamponamento de ROS.
  • A morte dessas células precede a elevação da glicemia.

b) Diabetes da Hemocromatose (Diabetes bronzeado)

  • Esse tipo de diabetes é causado não por resistência insulínica primária, mas por redução absoluta da produção de insulina devido à ferroptose celular.

c) Pancreatopatia mista

  • Além das células β, células acinares também sofrem com ferroptose, o que pode levar a pancreatite oxidativa crônica não alcoólica.

5. Articulações: artropatia oxidativa incapacitante

a) Deposição sinovial e condral de ferro

  • O líquido sinovial de pacientes com hemocromatose avançada contém partículas ricas em ferro.

b) Morte ferroptótica de condrócitos

  • A oxidação lipídica leva à degeneração da cartilagem, microfraturas e erosão articular.
  • Isso resulta em artrite erosiva dolorosa, muitas vezes confundida com osteoartrite ou pseudogota.

c) Resistência a anti-inflamatórios

  • Como o dano é oxidativo e degenerativo, e não inflamatório clássico, responde mal a AINEs e corticoides.

6. Rins: lesão túbulo-intersticial por sobrecarga de ferro

a) Reabsorção renal de ferro

  • Nos túbulos proximais, o ferro filtrado é reabsorvido — e aí começa o dano.
  • As células tubulares são altamente dependentes de GSH e GPX4.

b) Indução direta de ferroptose

  • Observa-se perda tubular, atrofia cortical, proteinúria, e em casos mais graves, insuficiência renal crônica secundária à ferroptose.

 

Ferroptose como fator unificador da degeneração multissistêmica na Hemocromatose

A ferroptose não é apenas um conceito molecular. Ela é o pano de fundo silencioso, mas destrutivo, de toda a fisiopatologia avançada da hemocromatose, oferecendo:

  • Uma explicação coerente para o padrão histológico multiorgânico observado
  • Um alvo farmacológico para interromper a progressão de lesões irreversíveis
  • Um marcador prognóstico emergente (com potencial aplicação futura na estratificação de risco)

Comprometimento Orgânico na Hemocromatose via Ferroptose

Órgão/Sistema

Lesão por Ferroptose

Mecanismo Central

Pâncreas

Destruição de células β, Diabetes bronzeado, Pancreatopatia crônica

Morte seletiva das células β sensíveis ao ferro, acinar por estresse lipídico

Articulações

Degeneração condral oxidativa, Artropatia erosiva incapacitante

Morte de condrócitos por peroxidação, acúmulo sinovial de ferro

Rins

Nefropatia túbulo-intersticial oxidativa, Insuficiência renal progressiva

Dano oxidativo tubular por reabsorção de ferro e falência de GPX4 renal

Fluxograma  – Progressão da Hemocromatose via Ferroptose

  1. Início do processo:
  • Hemocromatose Hereditária (geralmente por mutações no gene HFE, como C282Y, H63D, S65C)
  • ↓ Redução da hepcidina hepática
  • ↓ Aumento descontrolado da absorção intestinal de ferro
  1. Saturação dos mecanismos de transporte:
  • Transferrina fica saturada
  • ↑ Formação de ferro não ligado à transferrina (NTBI) — altamente tóxico
  • NTBI circula e se deposita em múltiplos tecidos
  1. Deposição progressiva de ferro nos órgãos:
  • Alvo inicial: fígado
  • Posteriormente: coração, cérebro, pâncreas, articulações e rins
  1. Início da toxicidade ferro-induzida:
  • NTBI se converte em Fe² dentro das células
  • O ferro ferroso reage com peróxidos (H₂O₂) gerando radicais hidroxila (•OH) via Reação de Fenton
  • Estes radicais induzem peroxidação lipídica das membranas celulares
  1. Falência dos sistemas antioxidantes:
  • Depleção de glutationa reduzida (GSH)
  • Inibição funcional da enzima GPX4 (Glutationa peroxidase 4)
  • Interrupção do eixo protetor GSH–GPX4 contra peróxidos lipídicos
  • Acúmulo progressivo de danos lipídicos irreversíveis
  1. Ativação da Ferroptose (morte celular regulada):
  • Morte progressiva e silenciosa de células nos órgãos atingidos
  • Sem apoptose clássica ou necrose inflamatória evidente
  • roptose leva à falência orgânica múltipla, mesmo na ausência de inflamação evidente
  • Esta progressão pode ocorrer sem elevação marcante de enzimas plasmáticas em fases precoces, dificultando o diagnóstico

Resumo clínico

“A ferroptose é a via final comum do dano orgânico na hemocromatose.

Compreendê-la é fundamental para prevenir a evolução silenciosa para insuficiências hepática, cardíaca, neurológica e endócrina.”

Frases Temáticas – Para Reflexão

  1. “Na hemocromatose, o ferro deixa de ser nutriente e torna-se veneno — silencioso, oxidativo e letal.”
  2. “Enquanto a inflamação grita, a ferroptose sussurra — até que o tecido ceda em silêncio.”
  3. “Ferroptose: quando a falência do escudo antioxidante permite que o ferro ataque seu próprio hospedeiro.”
  4. “O carcinoma hepatocelular na hemocromatose não começa com dor, mas com a primeira molécula de lipídio oxidado.”
  5. “Muitos pacientes morrem do coração na hemocromatose, sem nunca saber que o ferro foi o executor.”
  6. “A ferroptose no cérebro explica por que a hemocromatose pode roubar a memória antes da saúde.”
  7. “Artropatias incapacitantes não vêm da idade, mas da oxidação sinovial silenciosa.”
  8. “Diabetes na hemocromatose é mais que glicose alta — é a morte do pâncreas pela mão do ferro.”
  9. “Compreender a ferroptose é abrir os olhos para a parte invisível da hemocromatose.”
  10. “Controlar o ferro é preservar os tecidos. Prevenir a ferroptose é prolongar a vida.”
  11. “A medicina do futuro tratará não apenas a ferritina, mas o destino da célula exposta ao ferro.”
  12. “A chave para vencer a hemocromatose não está só no sangue — está na mitocôndria.”

Referências Científicas Selecionadas

  • Stockwell BR, et al. Ferroptosis: A Regulated Cell Death Nexus Linking Metabolism, Redox Biology, and Disease. Cell. 2017. DOI: 10.1016/j.cell.2017.09.021
  • Friedmann Angeli JP, et al. Inactivation of the ferroptosis regulator Gpx4 triggers acute renal failure in mice. Nat Cell Biol. 2014. DOI: 10.1038/ncb3064
  • Tsurusaki S, et al. Ferroptosis in liver diseases: An update on basic mechanisms and clinical implications. Cells. 2020. DOI: 10.3390/cells9112513
  • Gao M, et al. Role of mitochondria in ferroptosis. Mol Cell. 2019. DOI: 10.1016/j.molcel.2019.09.014
  • Wang H, et al. Characterization of ferroptosis in murine models of hemochromatosis. Hepatology. 2021. DOI: 10.1002/hep.31827

Referências Científicas Recentes – Ferroptose na Hemocromatose (2023–2025)

  1. Stepanov N, Sano H. Ferroptosis: mechanisms and implications in iron overload disorders.
    Biochemical Society Transactions. 2023;51(6):1707–1718.
    🔗 https://doi.org/10.1042/BST20230057

  2. Xu L, Wang X, Wu J, et al. Ferroptosis: A new insight into liver diseases.
    Frontiers in Pharmacology. 2023;14:1196287.
    🔗 https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fphar.2023.1196287/full

  3. Zhang Z, Guo M, Li Y, et al. The role of GPX4 in ferroptosis and its clinical implications.
    Antioxidants (Basel). 2024;13(4):738.
    🔗 https://www.mdpi.com/2076-3921/13/4/738

  4. Yang Y, Lin Q, Li X, et al. Nrf2 and ferroptosis in iron-induced cell death.
    Redox Biology. 2025;65:102064.
    🔗 https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2213231725000643

  5. Chen X, Yu C, Kang R, Tang D. Ferroptosis in inflammation, immunity, and disease.
    Signal Transduction and Targeted Therapy. 2024;9(1):1969.
    🔗 https://www.nature.com/articles/s41392-024-01969-z

  6. Dixon SJ, Lemberg KM, Lamprecht MR, et al. Ferroptosis: An iron-dependent form of nonapoptotic cell death.
    Cell. 2012;149(5):1060–1072.
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